terça-feira, 21 de abril de 2009
Recomeços... ou do que se deixa para trás
Quando nos dispomos a seguir um novo rumo na vida após chegarmos àquela encruzilhada estranha das decisões pessoais, onde se aposta em um determinado movimento, o que realmente deixamos para trás?
Algo devemos deixar. Carregar tudo o que fomos o tempo todo conosco é extremamente cansativo e desgastante. Sem falar inútil. Mas o que realmente devemos descartar?
Que tal descartarmos as dores e as más experiências? Contudo... não foi com elas que aprendemos? Todos temos cicatrizes das nossas superações. Como uma cascavel que ganha um novo anel a cada troca de pele, nossas cicatrizes estão lá para nos lembrar do erros que não devemos mais cometer e das novas forças e habilidades que ganhamos. Mas cicatrizes curadas não doem. A dor deve ficar para trás.
O que mais fica para trás quando passamos para a próxima etapa de amadurecimento na nossa vida? Certas coisas não precisam ser carregadas por nós, pois sempre as encontraremos. Para que o fruto se desenvolva, é necessário sacrificar a flor. Em uma primeira etapa, a linda e delicada flor é substituída por um fruto verde e intragável. Poderíamos pensar que saímos perdendo, não? Logo após a perda, ainda lembramos da beleza da flor e não podemos aproveitar nada do novo fruto. Que tragédia! É preciso tempo e paciência para podermos colher o fruto doce, que alimenta o corpo, e percebermos que depois que comemos o fruto, o ciclo se renova. Portanto a ingenuidade também pode ficar para trás, ou arriscamos nunca mais deixarmos outra flor ser polinizada. Sem rancores, pois a encontraremos novamente, com outras roupagens, quando o tempo for propício.
Cada etapa da vida é rodeada por determinados medos, pois geralmente temos medo do que não conhecemos. O medo é uma propriedade inerente do nosso instinto de sobrevivência. Junto com a dor, ele é um importante sinalizador de que algo pode estar errado. Mas à medida que vamos ampliando nosso conhecimento, não poderíamos silenciar alguns de nossos medos? Se vamos de encontro a algo conhecido, mesmo que seja algo passível de gerar dor, não precisamos mais do medo, pois sabemos o que está lá e optamos por seguir em frente ou não. No entanto, o próprio conhecimento das consequências de nossos atos é o principal gerador de medo. Então neste caso podemos fazer uma troca: deixamos de lado o medo paralisante, e colocamos na nossa bagagem o respeito, muito mais leve e útil, pois não nos impede de tomar decisões difíceis porém necessárias. Sendo mais leve, o respeito nos permite crescer, enquanto o medo só nos deixa cada vez mais encurvados com o passar do tempo... Aproveitemos e troquemos também a culpa pela responsabilidade e assim estaremos mais próximos do perdão, que tem um efeito poderoso em amenizar o peso da nossa bagagem.
As lembranças! Ah, as lembranças... são tudo o que podemos levar conosco para qualquer lugar onde formos. Infelizmente no tocante a lembranças, parece que não temos muito o poder de escolha. Quanta coisa bonita e importante nos esquecemos e quanto coisa odiosa teimamos em lembrar! Cada lembrança, quando evocada, toma nosso tempo e nossa energia. Muitas vezes elas vem aparentemente sem ser chamadas, e ficamos felizes ou tristes, dependendo do seu conteúdo. O ponto todo é que as chamamos, a todas elas. Talvez não conscientemente, mas nós precisamos delas exatamente no instante em que surgem. Pois muitas delas nos dão dicas ou ganchos para nossas próximas escolhas, tarefas e superações. Às vezes uma lembrança desagradável vem à tona no exato momento em que podemos transformá-la. Ou uma lembrança incoerente surge no momento em que podemos entendê-la. Ou ainda aquela lembrança especial nos aquece quando precisamos de força ou de conforto. Levemos nossas lembranças, pois elas serão trabalhadas e reformuladas ao longo do caminho.
Teremos companheiros de viagem? Depende do caminho trilhado. Podemos ter companheiros por longos trechos ou companheiros circunstanciais. Ambos são importantes. Precisamos de companheiros para aprendermos sobre uma das coisas mais importantes da vida, que é o amor. Mas repetidas vezes, algum desses companheiros fica para trás. Choramos e gritamos pela perda, não percebendo que ele não faz parte da NOSSA bagagem. Queremos carregá-lo conosco a qualquer custo. Interrompemos a viagem prostrados ao seu lado, ou pior, agarrados de tal maneira que impedimos que ele também continue seu caminho. Às vezes ocorre o contrário, sentimos que nós não podemos prosseguir, pois não temos forças para andarmos sozinhos, sendo que eles também não podem nos carregar. Ninguém trilha o caminho de ninguém. Somos essencialmente sós e nossa bagagem é escolhida por nós. Optamos por carregar culpas e desejos alheios, optamos por abandonar os trilhos e fazer um novo caminho, optamos por jamais olharmos para os lados, optamos por acolher ou abandonar companheiros. Temos escolhas por todos os lados, inclusive a de não fazer escolha nenhuma, o que nos deixa exatamente no ponto onde começamos a viagem, na encruzilhada das decisões, sem aventura nem crescimento, nascendo e morrendo sem fazer a menor diferença para si nem pra ninguém.
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4 comentários:
Espero que esse teu texto tenha sido tão importante pra ti quanto foi para mim. Obrigado!
P.S.: o finalzinho dele, sobre fazer diferença pra alguém... bem... sinto que logo logo tu vai mudá-lo pra melhor. Faz parte.
Beleza de texto, Karin!
Permita-me discordar num ponto: filhos são uma bagagem, muitas vezes, involuntária até... mas estes, os carregamos até o fim da vida. Ou até que nos tornemos uma bagagem para eles, antes do fim.
Oi Walter! Fiquei contente com a tua visita e pela reflexão que ela gerou. Claro que nesse assunto só posso opinar como filha, e uma filha que está chegando no ponto da virada.
Não acho que filhos sejam automaticamente parte da nossa bagagem, a não ser enquanto somos responsáveis pelo seu desenvolvimento em seres independentes. Acredito que não os devamos carregar depois que passam a andar pelas próprias pernas. O que temos conosco eternamente é a relação de maternidade ou paternidade e tudo o que ela envolve: amor, responsabilidade, dedicação, respeito... Pais e mães verdadeiros (ideais?) estarão dispostos e presentes para dar apoio, auxílio, ou apenas consolo, mas não podem substituir os passos do filho em seus próprios caminhos.
No caso dos pais, estou descobrindo agora como me relacionar com eles nessas últimas curvas e retas. A responsabilidade aumenta muito, é claro. O crescimento é inevitável. Tudo para manter a independência, dignidade e alegria de viver se torna válido. E não deveria ter sido sempre assim?
Mas reconheço uma limitação. Meu texto se refere a pessoas independentes. Teu comentário me faz pensar agora naquele vídeo em que o pai faz uma corrida, empurrando e muitas vezes até carregando o filho deficiente... Ou os casos que conheço sobre pais com Alzheimer ou outras doenças terminais. Pais e filhos, e às vezes parentes, amigos ou meros conhecidos, que precisam integralmente da nossa dedicação, fazem parte de uma missão de vida única. Esse deve ser um caminho muito especial e bastante difícil...
Denis, eu é que te agradeço pela presença e pelo estímulo. Afinal de contas, foi por causa da tua encheção de saco que esse blog existe, hehehe. Eu tb espero que o final seja diferente. Ele tem que ser, pois não é a nossa função no caminho segui-lo? Certamente não é estagnar...
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