domingo, 12 de abril de 2009

O Toque na Noite


Apesar de ser uma pessoa que valoriza muito o lado racional da vida, sempre procurei de alguma forma uma porta de comunicação com o lado etéreo, que costumeiramente chamamos de espiritual. Não sigo nenhuma religião; embora compreenda seu valor nas vidas de muitas pessoas, nunca cheguei a sentir nenhum chamado interno que me levasse irredutivelmente a determinado dogma ou doutrina. Em outras palavras, me falta a tal fé. Também não sou uma pessoa naturalmente sensitiva, apesar de ter lá meus lampejos intuitivos. Mas voltando à porta, sempre senti que ela seria interna e, de fato, tenho cá o meu meio, que para mim funciona muito bem.

Eu sempre gostei de interpretar meus sonhos. Desde adolescente eu venho prestando atenção neles e tenho conseguido estabelecer uma linguagem simbólica interna bastante rica. Tenho vários sonhos recorrentes que me contam, em seus detalhes, o andamento de alguns processos internos. Já tive sonhos premonitórios também. E, de vez em quando, tenho alguns que considero realmente especiais, praticamente místicos ou iniciáticos que, ainda que se utilizem de símbolos ou pessoas do dia a dia, marcaram uma mensagem indelével do caminho sendo percorrido. Eles geralmente são acompanhados de uma emoção profunda ao acordar, seja de alegria ou de tristeza, mas sempre de forte impacto, e eu simplesmente SEI que aquele é especial, mesmo que não o compreenda de imediato.

Ao longo dos anos tenho guardado a transcrição de vários sonhos. Alguns eu nunca cheguei a decifrar. Outros me foram claros de imediato. E alguns continuam no background da minha mente, esperando o desenrolar dos acontecimentos. Um dos últimos sonhos realmente impactantes que eu tive foi há uns dois anos atrás e retrata um processo que acho (quero crer, ao menos) estou chegando cada vez mais perto de decifrar. Deixarei de fora a identificação das pessoas do mundo real que participaram dele, pois é uma simbologia que só diz respeito a mim já que esse não é um dos premonitórios. Ao invés disso, tentarei passar a emoção ou sentimento que cada um dos personagens desperta em mim, que é o mais importante. Considero esse sonho completamente simbólico, onde todos as pessoas são partes da minha própria psiquê. Nada no mundo externo está de fato esperando uma epifania da minha parte, assim como não dependo da participação de ninguém especificamente para chegar ao ponto em que aparentemente devo chegar. Mas após esse sonho acordei esbaforida e continuei a ouvir a música, estática, por alguns minutos...

Eram tempos perigosos. Eu estava na rua e havia apenas um lugar seguro. Uma casa, onde havia muita gente, outras pessoas que aguardavam apenas um sinal na noite.

Alguém me acompanhava, protetoramente, à distância. Um homem. Um amigo, irmão e companheiro. Seguindo instruções, eu corria pela rua para a casa, para a segurança, e ele corria atrás de mim, mantendo alguma distância. Enquanto anoitecia, passei por perigos, por pessoas gritando e brigas de bar, por balas perdidas, mas cheguei à casa. Eu entrei e fui direto para o fundos. Ele também entrou, esbaforido, não me viu, procurou-me pela frente da casa, onde havia várias pessoas que nada tinham a ver conosco, e se preocupou. Eu o encontrei e sinalizei que estava tudo bem.

Fomos aos fundos da casa. Uma família ou clã de mulheres nos aguardava. Uma anciã de aspecto frágil, que se enredou em sonhos e promessas como numa rede, disse que não podia se desvencilhar. Eu e meu pai (ainda o mesmo homem? acho
que não...) a encorajamos dizendo que o mesmo tinha acontecido conosco e que parecia impossível mas que tudo daria certo. A velha, mãe de todos nós que ali estávamos, foi ficando mais forte e pediu ao homem que me acompanhava que saísse para comprar algumas coisas para ela (acho que bebida e cigarro). Ele foi.

Enquanto isso, esperávamos por algo. Era noite. Crianças dormiam em um quarto. Olhávamos por uma janela ou varanda para uma paisagem de campo à noite. Parecia um grande charco. Encontramos alguns objetos (sagrados? com certeza especiais) e a velha tentava montá-los em algo mas não conseguia. Eu tentei... e sabia o que tinha que ser feito! Era uma espécie de instrumento musical que emitia um sopro grave, como um berrante. E de repente, depois que o toquei, outras notas se ouviram na noite. O som foi ficando mais limpo, cada vez mais alto e de repente virou música! Música e luz por todo o lado! Eu sabia tocar e esse era um instrumento mágico, que havia apenas esperado que EU montasse as peças e o tocasse.


E assim soubemos que o tempo que tanto esperávamos chegou! Estávamos em estado de euforia, felizes! Sabíamos que tínhamos que pegar objetos que guardávamos há muito tempo para cada um de nós. A anciã organizava apressadamente as coisas, juntava roupas de cama e roupas de dança de cada integrante da casa (eu estava vestida com uma roupa branca e dourada, misturada com uma saia vermelha). Sabíamos que agora, dentro em breve, depois que todos voltássemos à casa (e todos estavam ouvindo a música e correndo de volta para a casa) nós finalmente saberíamos para onde deveríamos ir. Lembro de amigas importantes e queridas chegando nessa hora e uma delas, feliz e eufórica, celebrava que era eu que tinha encontrado a chave e desencadeado tudo!

E você, quais são suas aventuras oníricas mais interessantes? Como sente os próprios sonhos: a eliminação do resíduo mental do cada dia ou eventos que transportam alguma mensagem mais significativa? Alguma vez algum sonho te elucidou algo importante?

4 comentários:

De Marchi ॐ disse...

Belo sonho! Auspicioso. ;)
E bem claro também...

Lido exatamente como você. Antigamente eu não só anotava como os desenhava. A primeira parte do teu texto reflete bem como lido e sinto os sonhos. Pra mim vai mais além, mas ainda não sei traduzir em palavras. Prometo que um dia falo sobre. :)

Karin disse...

Ah, como eu adoraria conseguir desenhar alguns dos meus sonhos! Na verdade, eu fiz isso uma vez, e com um sucesso duvidoso. Mas não adianta, não é o meu dom...

O dia que vc conseguir traduzir o seu sentimento em palavras, me conta. Eu sempre acho as minhas explicações muito superficiais. Eu sei o que eu quis dizer, mas parece tudo tão calculado, tão racionalizado... Enfim, vou aguardar. Promessa é dívida. ;)

De Marchi ॐ disse...

Me lembra de te mostrar algumas das pinturas... acho que elas têm mais valor emocional para mim do que como arte, mas enfim... são curiosas. :)

Karin disse...

Vou lembrar!