quinta-feira, 14 de junho de 2012

A arte de cuidar e de ser cuidada

Nos últimos anos, a maioria de nós mulheres cresceu ouvindo que precisavas ser independente. Cada uma ouviu e interpretou a seu jeito. Mulheres de carreira se acostumaram a buscar a auto-suficiência e criam todo o tipo de empecilho nos relacionamentos; mães e esposas se rasgam em tantos pedaços para dar conta de si e de todos na família que acabam esgotadas e desnutridas em muitos sentidos. Mas todas precisam mostrar e provar, especialmente para si mesmas geralmente na forma de algum arquétipo interior, que dão conta do recado, que conseguem segurar todos os pratos girando, sem deixar nada cair.

Os homens ficaram meio sem saber o que fazer nessa história. Tem aqueles que se acomodaram e seguem o fluxo, aproveitando esse furacão que funciona 24 horas ao seu lado, até mesmo porque aprenderam que é melhor não contrariar. Outros continuam buscando uma mulher que lhes permita exercer o papel do provedor, do protetor, essa função tão arraigada no espírito masculino que moldou toda a sociedade paternalista (e machista). Seja como for, o homem também busca cumprir com um papel que valide sua existência masculina.

E talvez seja a questão da causalidade invertida que faz tantos sofrerem, homens e mulheres. Homens que querem cuidar e mulheres que não se deixam cuidar. Mas o que é cuidar? E o que é precisar de cuidado?

Cartão de crédito é cuidado? Trocar um pneu é cuidado? Muitas mulheres ditas auto-suficientes afirmam com orgulho que não precisam de nenhum macho que lhe pague as contas, muito menos que resolva seus problemas. Até certo ponto, concordo. Mas o que conta não é o ato, é a intenção do ato. Você pode ganhar um carro e estar sendo cuidada… ou comprada. A diferença não está no carro, nem no preço do carro, está na pessoa que te deu o carro e na sua motivação.

Só consegue cuidar e se deixar ser cuidado quem se conecta com o outro em algum nível. Homens e mulheres que verdadeiramente cuidam e se deixam ser cuidados também não estão meramente desempenhando um papel na sociedade, estão se abrindo a relacionamentos.

Lágrimas

Raiva é o resultado do medo de sentir dor. A raiva pode estourar sem controle quando algo nos atinge. A explosão imediata impede a dor, desvia a atenção, e enquanto se sente raiva não se sente a dor. E se a gente quiser interromper a dor mais tarde, antes de terminar de sentí-la por completo, essa dor vira ressentimento, que nada mais é do que uma forma de raiva branda e persistente. Tem que ser muito forte para se permitir sentir a dor até ela esgotar. Desconfio que ter prazer em sentir dor também é uma fuga, pois é preciso ter coragem de ir ao fundo da dor e em seguida encarar o que traz a dor. E não adianta fingir que gosta. Despeito também é uma forma de raiva. E como a dor emocional rasga o peito, o coração, a alma! Dóem todas as vísceras, dói respirar, dói não respirar, dói até a gente passar mal… mas uma hora a dor passa! Pode não ser de uma vez, dependendo da dor ela pode voltar em surtos durante anos, mas quando se encara o motivo da dor e se permite que doa até o último fio de cabelo, cada surto também passa. E se não desaparecem de vez, costumam ao menos se tornar mais leves e espaçados. Tem que ter muita coragem pra sentir dor. Ainda assim, é muito melhor sentir dor do que sentir raiva. A dor passa e vc se vê frente a frente com a causa da dor. As lágrimas, depois que secam, deixam limpa a vista da alma. Depois da dor vem uma certa anestesia e nesse momento até o medo fica de lado. Sobram vc e a fonte da sua dor. Já a raiva corrói o corpo e a alma. A raiva nos consome por dentro, vira doença. Pode até ser que num momento de ira consigamos usá-la para sobrepujar alguma dificuldade. A raiva é a fonte de energia do "righteous anger", é capaz de quebrar as paredes… ou os seus punhos. Mas a raiva nos permite atropelar o outro e a nós mesmos, nos cega a ponto de nos permitir machucar a quem mais amamos… o que acaba retro-alimentando a dor, o medo e a própria raiva. A raiva desintegra… as lágrimas lavam a alma. Fico com as lágrimas.